Os valores de uma sociedade são definidos a partir das crenças individuais, dos valores e das ações dos homens e mulheres que fazem parte dela. São esses valores que serão representados pelos políticos, pelos administradores públicos, pelos homens que vão decidir o destino e os rumos do país.
Uma sociedade não pode eleger representantes melhores que ela. Isso é evidente. Uma sociedade que acha normal jogar no bicho - uma atividade ilegal que financia outras - não pode esperar que os seus representantes levem a sério o combate ao crime. Uma sociedade que, no seu dia-a-dia, se utiliza da propina para resolver entraves burocráticos e se livrar de punições legais, não tem o direito – e nem a mínima possibilidade – de exigir que seus representantes eleitos não façam o mesmo. No Brasil, a propina vai de baixo para cima, e não o contrário.
E, no entanto, a maioria das pessoas não parece perceber isso. Existem duas possíveis explicações.
Uma explicação é ingenuidade: as pessoas acreditam, realmente, que embora elas possam estacionar em qualquer lugar, jogar lixo na rua, subornar autoridades – foi só essa vez, eu estava com pressa, não teve outro jeito – todo o resto do país deveria obedecer a lei. A outra explicação, mais provável, é uma imensa hipocrisia, que domina a todos, independente de classe, educação e condição social. É o famoso jeitinho brasileiro, na verdade uma força poderosa de atraso e ignorância. É a Lei de Gérson.
É o pobre que reclama do crime, mas joga no bicho, e com isso sustenta os seus algozes. É a funcionária pública que reclama dos reajustes salariais, mas não cumpre as obrigações trabalhistas com sua empregada. É o empresário que paga suborno, para em seguida reclamar do governo.
É a hipocrisia do cidadão que compra uma carteira de estudante, e o cinismo do legislador que força o cinema a vender meia-entrada, mesmo tendo pleno conhecimento de como essa carteira é obtida. É a cara-de-pau das instituições “estudantis” que compactuam com essa farsa.
É o país do faz de conta, onde é possível, ao mesmo tempo, consumir drogas (que ainda são, independente da opinião de cada um, ilegais) e reclamar do domínio dos traficantes sobre a nossa sociedade.