A Fraude da Indústria do Sucesso

Então. Você nunca escuta falar do Fernando, o cara que faliu, perdeu tudo e agora mora de favor com a sogra.

No programa americano Saturday Night Live um comediante interpretava Matt Foley, um palestrante motivacional fracassado que morava em uma van à beira do rio.

Você escuta os gurus de gestão, você ouve o que dizem os palestrantes motivacionais e você pensa no Matt Foley. Ninguém diz coisa com coisa.

Todas as histórias dos gurus são sobre pessoas de muito sucesso. Você nunca escuta falar do Fernando, que perdeu tudo e vive de favor na casa da sogra. Nenhuma palavra sobre as lições do Fernando. Imagine como elas devem ser importantes.

Na vida, assim como nos negócios, encontramos o que os acadêmicos chamam de problema da atribuição: você observa um fenômeno - uma empresa de sucesso, a fortuna acumulada por alguém, uma meta anual de vendas batida no primeiro trimestre - e não consegue saber a verdadeira explicação daquilo.

Pode ter sido pura perseverança. Pode ter sido visão. Pode ter sido qualidade total, reengenharia, capacidade de delegar, orçamento base zero, CRM, big data ou software como serviço. A causa pode ter sido um pai inspirador ou uma esposa que enchia o saco. A verdade é: ninguém sabe.

Mas todo mundo acha que tem a resposta. Existem centenas de receitas para levar você ao sucesso, com uma única coisa em comum: todas enriquecem os gurus.

Converse com pessoas normais e você vai encontrar dois grupos. Um deles diz que a vida é curta e que você deve correr atrás do seu sonho. Escreva aquele livro, viaje para a Andaluzia, crie a startup que usa satélites para educar as crianças no Sudão. Mude pra Milão. Pule de paraquedas.

O outro grupo diz: caia na real. Arrume um emprego, trabalhe duro, seja promovido, acumule patrimônio. Você não precisa amar o que faz; a maioria das pessoas não ama seu trabalho. Você só precisa ser produtivo, dar sua contribuição. Ganhar dinheiro. Você vai precisar dele.

Conheço pessoas que escolheram um ou outro caminho. Algumas são felizes, outras não. Mas nunca ouvimos falar dos infelizes. Os relatos de fracassos que conhecemos são aqueles em que o fracassado conseguiu fazer sucesso depois - são aquelas as histórias cuja moral é "a persistência acaba levando ao sucesso". Mas a lógica diz que para cada indivíduo muito bem sucedido deve haver muitos outros que nunca conseguiram sucesso, que faliram, passaram suas vidas em carreiras medíocres ou acabaram em uma velhice vazia e solitária.

Não vamos nos enganar: as escolhas que encontramos na vida não são simples. Não é possível reduzi-las a um cardápio de opções prontas para consumo. Mais importante ainda: as reais consequências de muitas de nossas decisões nunca serão conhecidas. Vivemos aprisionados em uma racionalidade limitada, como Herbert Simon, o único psicólogo a ganhar o Prêmio Nobel, descreveu nossa imperfeita capacidade cognitiva.

Então sejamos honestos e humildes. O acaso tem um enorme papel em nossas vidas. Está na hora de perceber que não somos tão espertos, determinados e ousados quanto acreditamos.

Está na hora de admitir que muitas das histórias de sucesso dos bilionários e megaempresários são versões editadas, das quais foram cuidadosamente removidas as perdas e os momentos de amargura e desespero. A medida de sucesso desses heróis corporativos é individual e não se aplica a todo mundo.  Nem todas as pessoas precisam ter sua própria companhia aérea, sua empresa de bebidas ou sua cadeia de lojas - e nem todos podem pagar o preço dessas conquistas. Assisti uma vez à apresentação de um CEO superstar que revolucionou vários mercados, viveu em cinco continentes e chegou ao topo de sua indústria. Na saída do auditório encontrei um amigo que o conhecia pessoalmente. "É odiado por todos", ele me sussurrou, "tiraniza até os filhos". É um preço alto demais para o sucesso, na minha opinião.

Ouvimos os alpinistas das montanhas corporativas nos explicando como sua determinação e sua autoconfiança os tornaram super-homens. Eu digo que precisamos também ouvir aqueles que seguiram por caminhos menos trafegados: os que escolheram vidas calmas, que preferiram passar tempo com suas famílias a acumular um milhão de milhas aéreas.

Precisamos também ouvir aqueles que fracassaram. É provável que as lições mais importantes tenham sido aprendidas pelos que se perderam nos becos sem saída da vida. Essas pessoas não escrevem em blogs. Nunca ouvimos os homens que teriam tantas lições a nos ensinar.

Nunca ouvimos o Fernando, que perdeu tudo.