Para Não Dizer Que Eu Não Falei de Livros

Desliga o master chef e senta aqui que eu vou recomendar sete livros. Não são livros fáceis, mas são absolutamente necessários. Não se encaixam em nenhuma ideologia prét-à-porter. Eles propõem ideias novas — em alguns casos, radicalmente novas.
Sabe como é: para mudar o Brasil não basta vontade. Antes de propor respostas é preciso entender quais são as perguntas. Esses são livros sobre perguntas.
Eles valem por um mestrado acadêmico. Sério. Apresentam teorias sobre a desigualdade entre as sociedades e pessoas, sobre os reais objetivos da política e sobre as causas do nosso atraso. Esses são livros que ensinam a raciocinar. Pense neles como uma Bodytech da mente.
Esses livros são parte do meu segredo. Não espalha, ok ?
Recomendação da Prof. Carmen Migueles

Cultures and Organizations

Hofstede é um clássico do estudo comparado de culturas que até hoje não foi superado. É para ler saboreando o texto e para ficar de boca aberta com as informações. Entenda porque o problema do Brasil não é desigualdade de renda, mas desigualdade — distância — de poder. Mas atenção: esse livro faz questionamentos sérios, consistentes e bem-fundamentados sobre todas as ideologias. Prepare-se.
Não diga que eu não avisei.
Olha aqui:
“Culturas nacionais são parte do software mental que adquirimos durante os primeiros dez anos de nossas vidas, na família, no ambiente social e na escola, e contém a maior parte dos nossos valores. Culturas organizacionais são adquiridas quando entramos em uma organização como jovens adultos ou adultos, com nossos valores já firmemente estabelecidos, e consistem principalmente de práticas da organização — elas são mais superficiais” .
“Em países com alta Distância de Poder, como o Brasil, superiores e subordinados se consideram existencialmente desiguais, e a hierarquia é baseada nesta desigualdade existencial, com grandes variações salariais entre a base e o topo. As organizações centralizam ao máximo o poder, empregados esperam por ordens, e trabalho manual tem um status muito inferior ao trabalho de escritório. O chefe ideal aos olhos dos subordinados, aquele que os deixa mais confortáveis e pelo qual têm o maior respeito, é o autocrata benevolente. Em países com alta Distância de Poder as relações entre chefe e subordinados são carregadas de emoção”.
Recomendação de Raphael Rotgen

Intelligent Governance for the 21st Century

Um livrinho muito importante — e curto, rápido e gostoso de se ler, totalmentefora da caixa, beirando a incorreção política. Leia para saber que (1) até o regime político da China tem pontos positivos que merecem consideração e que (2) o problema central das democracias ocidentais é combinar uma sociedade de consumo baseada na gratificação imediata com um sistema eleitoral universal. Esse livrinho vai abalar muito do que você sabe, ou acha que sabe, sobre política, gestão pública e representatividade eleitoral. De quebra, ele sugere um novo regime representativo muito fora da caixa para substitutir o modelo clássico de democracia republicana (que, geralmente, se transforma em populismo puro).
Olha aqui:
“No Ocidente, a última palavra é dos eleitores, que aceitam se submeter a determinada forma de governo. Mas a chave da boa governança é dissociar a formulação de políticas públicas da ‘vetocracia’. Ao invés de votar considerando apenas seu interesse imediato, ou ser forçado a decifrar a propaganda e os jargões eleitoreiros dos interesses corporativistas, o eleitor deveria ter a chance de escolher entre políticas públicas propostas por entidades cuja missão seja considerar o interesse da sociedade no longo prazo.
Os problemas atuais com governança no Ocidente sugerem que é necessária uma evolução da democracia. Instituições com elementos meritocráticos devem ser estabelecidas como contrapeso aos interesses corporativistas e de curto prazo da cultura política das democracias eleitorais”.
Sugerido por Jairo Nicolau

Patterns of Democracy

Para quem quer entender o que é democracia, o que são sistemas políticos majoritários e de consenso (caso do Brasil), e as diferenças entre presidencialismo e parlamentarismo. Lijphart estuda 30 países considerados democracias consolidadas (não estamos na lista). A leitura é, às vezes, um pouco lenta, mas vale a pena.
Olha aqui:
“Definir democracia como “o governo pelo povo e para o povo” resulta em uma questão fundamental: Quem vai governar, e que interesses devem prevalecer quando os eleitores discordam e têm preferências diferentes ? Uma resposta a esse dilema é: a maioria dos eleitores. Esse é o sistema majoritário de democracia. […] A resposta alternativa é:tantas pessoas quanto possível. Essa é a proposta do modelo da democracia por consenso.
[…] Poderes presidenciais tem três origens. A primeira é a Constituição, que define “poderes reativos”, especialmente o poder de veto presidencial, e “poderes proativos”, como a habilidade de legislar por decreto em certas questões. A segunda fonte de poder é a força e a coesão dos partidos que apóiam o presidente. Por último, presidentes obtém força considerável dos votos diretos que os elegeram — eles podem argumentar que são os únicos funcionários públicos eleitos pelos cidadãos”.
Muito, muito bom.

The Great Degeneration

Esse é O LIVRO. Ele resume em poucas páginas, deliciosas de se ler, o que outros livros (por exemplo, o Por Que as Nações Fracassam) levam quatro vezes mais páginas para explicar. Entenda o porque do declínio econômico das democracias ocidentais e, de quebra aprenda, o que precisamos fazer para consertar a nossa.
Olha aqui:
“[…] Nós, humanos, vivemos em uma complexa matriz de instituições. Existe o governo. Existe o mercado. Existe a lei. E existe a sociedade civil. Em um determinado momento essa matriz funcionou maravilhosamente bem, com cada conjunto de instituições completando e reforçando as outras. Isso, acredito, foi a chave do sucesso do Ocidente nos séculos XVIII, XIX e XX. Mas as instituições do nosso tempo estão quebradas.
[…] Países atingem um estado estacionário, como disse Adam Smith, quando suas ‘ leis e instituições’ se degeneram ao ponto dos interesses corporativistas da elite dominarem o processo político e econômico. Esse é o caso em partes importantes do Ocidente de hoje. A dívida pública — explícita e implícita — se tornou uma forma das gerações mais velhas viverem às custas dos jovens e dos que ainda não nasceram. A regulação se tornou disfuncional ao ponto de aumentar a fragilidade do sistema. Advogados, que podem ser revolucionários em uma sociedade dinâmica, se tornam parasitas. E a sociedade civil definha e se torna uma terra de ninguém entre os interesses corporativos e o Estado inchado. Esses são os elementos que caracterizam a Grande Degeneração”.
Livre-se da Teoria da Dependência

How Latin America Fell Behind

Esse livro é um conjunto de artigos de diversos autores falando sobre desenvolvimento econômico no Brasil e no México no século XIX. É um livro imprescindível. Parece um assunto chato, só que não. Esse livro traz uma explicação clara sobre as razões do nosso atraso (spoiler: a culpa é nossa mesmo) e sobre a precariedade intelectual e falsidade metodológica da escola desenvolvimentista (leia-se CEPAL) que criou a fantasiosa “Teoria da Dependência”, que até hoje envenena nossa cultura. Leitura obrigatória.
Olha aqui:
Logo, muitos estudiosos da América Latina começaram a acreditar, como artigo de fé, que o subdesenvolvimento da região era resultado do próprio capitalismo. Esses estudiosos rejeitaram a tradição neoclássica de análise econômica. Como associavam as poderosas ferramentas analíticas e quantitativas de estudo do crescimento econômico com um conjunto específico de políticas públicas, eles abandonaram a análise sistemática de dados, apoiada pela teoria, como um modelo para pesquisar a história econômica da região. O resultado foi a rápida ascenção e predomínio da escola de pensamento que ficou conhecida como Teoria da Dependência.
A Teoria de Dependência combinou noções Marxistas de análise de classes com uma crítica estruturalista da teoria do comércio internacional. […] A Teoria da Dependência se tornou — e continua a ser — o tema dominante na organização da maioria dos livros sobre história econômica da América Latina.
Porém, essa teoria apresenta três problemas. O primeiro é que ela utiliza um racioncínio econômico improvisado. […] O segundo problema era a rejeição da noção de que ideias devem ser submetidas à avaliação científica. […] O terceiro problema é que sua proposição central é inconsistente com os fatos empíricos.
Recomendação da Prof. Carmen Migueles

Institutions, Institutional Change and Economic Performance

Um clássico da Teoria das Instituições, que todos que querem exercer sua cidadadia de maneira informada precisam ler. Um livro fino, escrito em uma liguagem acadêmica mas acessível. Douglas North é o cara. Sua teoria das instituiçoes confirma, através de uma abordagem acadêmica, o que sempre suspeitamos: nosso país não avança devido à precariedade das instituições (Ibéricas) que herdamos. Leia para arrasar em seus debates com esquerdistas.
Olha aqui:
Instituições são as regras do jogo em sociedade ou, mais formalmente, são as restrições criadas pelo homem que moldam as interações humanas. Como consequência, elas estruturam os incentivos nas trocas entre as pessoas, sejam as trocas políticas, sociais ou econômicas. A mudança institucional molda a forma com a qual as sociedades evoluem ao longo do tempo e são a chave para o entendimento das mudanças históricas.
Não se discute que as instituições influenciam o desempenho econômico. Não se discute também que a diferença entre o desempenho econômico entre países é influenciada pela evolução das instituições
[…] Instituições são as fundações sobre as quais a humanidade, ao longo da história, vem construindo ordem e tentando reduzir incerteza nas trocas. Junto com a tecnologia, elas determinam os custos de transação e transformação e, portanto, a rentabilidade e viabilidade de iniciar uma atividade econômica. Elas conectam o passado com o presente […] Elas são a chave para entender o interrelacionamento entre política e economia e as consequências desse relacionamento para o crescimento (ou estagnação e declínio) econômico.
Encontrado por acaso em uma livraria

O Imbecil Coletivo

Esse foi o livro que começou a revolução na minha cabeça, lá por volta de 1994. Foi quando descobri que era possível criticar as vacas sagradas da cultura nacional. Foi quando descobri que não era só eu que achava tantas coisas absurdas na política e na cultura. É, acima de tudo, um manual de como raciocinar. Leitura obrigatória.
Olha aqui:
“Entre as causas do banditismo carioca, há uma que todo mundo conhece mas que jamais é mencionada, porque se tornou tabu: há sessenta anos os nossos escritores e artistas produzem uma culstura de idealização da malandragem, do vício e do crime […] ladrões e assassinos sã essencialmente bons ou pelo menos neutros, a polícia e as classes superiores a que ela serve são essencialmente más.
[…] O que é um assalto, um estupro, um homicídio, perto da maldade satânica que se oculta no coração de um pai de família que, educando seus filhos no respeito à lei e à ordem, ajuda a manter o status quo? O banditismo é, em suma, nessa cultura, ou o reflexo passivo e inocente de uma sociedade injusta, ou a expressão ativa de uma revolta popular fundamentalmente justa.
[…] A conexão universalmente admitida entre intenção e culpa está revogada entre nós por um atavismo marxista erigido em lei: pelo critério ‘ético’ da nossa intelectualidade, um homem é menos culpado pelos seus atos pessoais do que pelos atos da classe a que pertence”.