Ondas


"The Right" na Austrália. Naturalmente, não sou eu na foto.

De todas as coisas que não sei fazer, nenhuma me dá tanto prazer e medo quanto surfar. Estou aprendendo. Há trinta anos.

Surfe exige enorme coragem física de alguém que, como eu, teme altura e profundidade. Coragem para contemplar o abismo de uma onda grande, e descê-lo; para permanecer sereno no escuro do fundo, enquanto o punho do universo te comprime em um turbilhão raivoso, determinado.

E mais que isso. Quem surfa desenvolve uma inteligência que só tem paralelo na dança, na escalada sem cordas e na música. São ajustes finos no equilíbrio do corpo que governam a prancha; é uma discreta pressão dos pés, uma flexão dos joelhos. Os braços abertos de um anjo. O contato da mente com a tábua que desliza acelerada sobre o líquido, adivinhando vontades e respondendo a comandos.

Surfar é esquiar uma avalanche.É fazer snowboard sobre uma montanha em desconstrução. É confiar em um raciocínio corporal instantâneo, zen, além do alcance do pensamento, primitivo, primal.

Cada um tem sua onda. A minha foi na Barra da Tijuca, em um manhã da década de 90. Em certo momento olhei sobre o ombro e vi, atrás e ao meu lado, uma paisagem de morros líquidos, cortados em rampas, vales e platôs; massas de água que iam e vinham, se sobrepondo e se contradizendo, criando a sequência de volumes de uma cordilheira momentânea azul-turquesa. Durou alguns segundos. Estou naquela onda até hoje.

Esperando as montanhas